25 abril 2010





(Whatever Works, 2009, EUA, França). Facilmente se ouviu durante os lançamentos Match Point, Sonho de Cassandra e Vicky Cristina Barcelona  "cadê o velho Woody Allen?". Não que houvesse algo de errado. Essa pergunta, apesar de um tanto limitada, demonstrava a nostalgia que filmes como os citados nos causava. É que o profílico diretor acostumou mal seu vasto público, conquistando-o com Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, Manhatan (meus favoritos), Filmando no Escuro, Zelig, entre dezenas de outros. Agora, aquela comédia tagarela, com reflexões aos borbotões na mesa de bar com os amigos, no sofá da sala ou num café de Nova York, está de volta. Tudo Pode Dar Certo traz um personagem ranzinza, mal humorado, intelectualizado, como uma espécie de alter ego do diretor. Boris, interpretado por Larry David, é excêntrico, se considera mais inteligente que os outros e lembra alguns trejeitos de Allen, da época em que interpretava seus personagens. Não raro, se deseja ver o baixinho judeu do Brooklin na tela. E entre tramas e subtramas, claro, piadas de judeus, conversas com o espectador (não quero usar a expressão "cenas metalinguísticas", urgh!) etc. Whatever Works brinca com estereótipos, ironiza clichês e torna leves temas relativamente profundos. Divertido com a conhecida pretensão de Allen. Se distancia da superficialidade, se aproveitando dela. 

20 abril 2010


(The Burning Plain, EUA, Argentina, 2008). Na condição de roteirista, o premiado Arriaga defendia, neste e nos filmes anteriores com Iñárritu – 21 gramas e Amores brutos – créditos de sua autoria. Mas era uma vez uma parceria. Agora, Arriaga vem à tona com um filme livre de reivindicações desse estilo, mas que, por ironia ou não, reverbera os trabalhos anteriores, feitos enquanto alguma paz ainda reinava. E é exatamente o aspecto formal de Vidas que se cruzam o elemento crucial que permite tal comparação.

Apresentar personagens e suas histórias aparentemente desconexas, aparece, aqui, como o trunfo, a grande sacada, a carta na manga. O longa oferece o decifrar interativo: as tramas tem genes compartilhados. E, neste trabalho, cuja direção pode creditar sem dor na consciência, Arriaga entrega ainda mais ao espectador onde estão os pontos a serem ligados. Não há crítica negativa ao se dizer isso. Filmes não são necessariamente jogos.

Uma mulher se aventura para além de seus limites conjugais, outra é mais desprendida de moralismos sexuais e uma jovem vive um relacionamento com um garoto desaprovado pelo pai por motivos maiores. A descrição dessas três personagens já é maior que toda a sinopse do longa e, mesmo assim, ainda fala pouco sobre o que de fato vemos se costurar na tela. São dramas em seus primeiros momentos um tanto insossos. Ao longo das revelações (não é preciso levar tão a sério essa palavra), as perturbações e as atitudes dos personagens vão ganhando mais sentido. E se por hora, alguma cena soa patética, alguma justificativa está para derrubar mais a frente a aparente irrelevância.

Tangencial, o filme flui com uma câmera de planos médios, por vezes na mão. Kim Basinger, Charlize Theron e Jennifer Lawrence estão bem em seus papeis principais, sem exageros. Dão a linearidade que o filme não tem, para o bem ou para o mal. E isso conta.

Até que se prove o contrário, esta é a estreia de Arriaga na direção de um longa-metragem. Antes, apenas um curta de cinco minutos oficializou o mexicano nesta função. O que importa é que Vidas que se cruzam, a bastar pela tradução, demonstra uma marca já exausta pelo próprio diretor. Não está louco quem sentir cheiro de vingança na poeira de um deserto do México. E embora desaprovem seu estilo e suas manias reivindicatórias, ele se consagrou. Mas se por algum motivo, Arriaga pensou em ser mais, será por que pensou que fosse menos? Este longa ainda não é o melhor cartão de visita do roteirista-diretor, contudo clama por uma renovação. Isso é sempre bom para quem já mostrou que sabe fazer.