10 março 2011

Restrepo


(Restrepo, EUA, 2010). O combate ao terrorismo da Doutrina Bush deu nova face à guerra retratada pelo cinema contemporâneo. No lugar de romances ou dramas pessoais em meio ao caos do bombardeio dos world wars movies, eclode uma estética realista, documental, que mira o instante: o tiro certeiro, a fuga ou a ameaça do inimigo. O interesse está na ação e mesmo que surjam tentativas de humanizar a caça instaurada no Oriente Médio, o contexto pós-11 de setembro fica suspenso. Nada de debates. O embate é visto de dentro e, por isso, centralizado na saída e na volta para casa de soldados norte-americanos. Ares, só ares, de um novo Vietnã.

É exatamente assim que Restrepo, o documentário filmado pelos diretores Tim Hetherington e Sebastian Junger, justifica-se. O filme acompanha a missão do segundo pelotão da Companhia de Batalha dos EUA durante a ocupação, em 2007, no Vale Korengal. O local é considerado o ponto mais perigoso do Afeganistão, onde mais de 50 soldados “morreram lutando” — enfatizam os créditos finais —, até a retirada das tropas em 2010. Nomeiam o posto de Restrepo em homenagem ao médico do pelotão, morto em um ataque à tropa norte-americana. 

Menos impactante que Zona verde e Guerra ao terror, por exemplo, Restrepo aparentemente tem mais álibi para chocar com a realidade do que a ficção. Mas não é bem isso que acontece e a contradição é compreensível. O documentário não segue uma cronologia ou sequer tem uma história para contar. A falta de roteiro atrapalha e gera um longa de cenas acidentais, entrecortadas por entrevistas em estúdio com meia dúzia de soldados. Distante da densa vegetação e do relevo montanhoso afegão, rostos em close se dividem entre a recordação e o estarrecimento.

Com um sentimentalismo impelido, o testemunho da morte do melhor soldado do grupo é o ponto-alto do filme. Aos que permaneceram, o medo de não sobreviver. E uma interrogação paira por ali: “o que exatamente estamos fazendo aqui?”. Não surpreende um dos jovens soldados contar que, por conta de sua criação hippie, não tivera brinquedos violentos na infância. O rapaz, de olhares fugidios, parece buscar uma razão para a farda e não encontra.

Para afiançar ainda mais o discurso de que são seres humanos contra monstros do Talibã, Restrepo insinua do início aos extras uma relação familiar entre os militares. A seriedade por vezes dá lugar a brincadeiras bobas, que, de qualquer forma, não amenizam o clima de tensão. O documentário só é curioso quando põe soldados frente a frente aos anciãos do Korengal, que, ao relembrarem a figura de Bin Laden, evocam o enigma do terreno ocupado pelos EUA.

E, embora o dia a dia de conflitos dos soldados não chame tanta atenção como se espera, o longa consegue se resguardar da espantosa presença dos realizadores do documentário. Com a função de registrar os acontecimentos, a coragem prevalece como o elemento mais admirável de Restrepo. Quanto à batalha enquadrada pela câmera na mão, é estranho encarar, mas é um fato: a realidade anda perdendo para a ficção. Pois se o objetivo é demonstrar a idealizada luta do bem contra o mal, Restrepo é, portanto, uma grande falha como artifício de legitimação da guerra.

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